quinta-feira, 7 de junho de 2012

LIRA PAULISTANA - A VANGUARDA PAULISTA - UM FILME DE RIBA CASTRO

 
O log atualizado para o filme vira cartaz do filme:   
'LIRA PAULISTANA - 30 ANOS DEPOIS" 

          Trinta anos depois, a história do LIRA PAULISTANA vira filme. Pelas mãos de Riba de Castro, um dos sócios e diretor do projeto visual e inicial do Lira Paulistana. A história do LIRA é uma história de porões e garagens de São Paulo. 
          Desde a década de sessenta pelo menos, a cidade de São Paulo  mantém uma relação de amor e ódio com seus porões e sua periferia.
          Depois da semana de 22 no Teatro Municipal , São Paulo gerou em seus  subterrâneos,  movimentos literários como o dos poetas surrealistas brasileiros, a poesia  e a arte concreta nos fins de 50 e  início de 60 e no fim dessa década e início de 70, centros de tortura e repressão política como DEOPS com suas celas frias, funcionavam próximo da Estação da Luz  e o DOI-CODI com seus torturadores, paus-de-arara, choques elétricos e cadeira-do dragão (que ironicamente foi construída no Liceu de Artes e Ofícios ) na rua Tutóia nos fundos da 36ª Delegacia por onde passaram intelectuais de esquerda da época. Abrigou também espalhados pela cidade, "aparelhos", que eram casas comuns onde moravam "guerrilheiros" de organizações como a Ala Vermelha, ALN, VPR, VAR-PALMARES,MRT e outras que  produziam amplo material gráfico ( panfletos, jornais) fomentando a luta de resistência contra a ditadura burguesa-militar.
         Nesse mesmo período, teatros como o Arena e depois o Oficina fizeram história com montagens  sempre com propósitos de expansionismo artísticos socializantes e críticos. Ainda teve na boca do lixo o movimento de cineastas onde se situou o "cinema da boca" ou "cinema marginal" de onde surgiram nomes como Rogério Sganzerla, Ozualdo Candeias, Carlos Reichenbach , José Mojica, a imprensa "alternativa"  e até hoje as ruas da cidade tem sido o campo onde se manifestam abertamente essas batalhas artísticas, estéticas, politicas,existenciais e para onde vão se projetando resultados finais. 
Nossos melhores produtos, nosso bem e nosso mal sempre terminam expostos em nossas ruas,calçadas,praças , teatros , cinemas , shoppings ou bancas de jornais.
    BELA VISTA, BEXIGA E BIXIGUINHA 

        Ainda resistia o teatro Ruth Escobar e com o surgimento do Treze de Maio, na Bela Vista o  "Bixiga" tornou-se o centro da contracultura gerando o "Bixiguinha" ( uma espécie de Baixo Bexiga como decorrência do Baixo Leblon no Rio) No Treze, se apresentaram e foram lançados Jorge Mautner em seu retorno e exílio dos EUA,  "Secos & Molhados" com Ney Matogrosso à frente, os "Dzi Croquetes" com o bailarino e coreógrafo Lennye Dale, Edy Star, Papa Poluição, Jards Macalé, Walter Franco , o Pessoal do Ceará no programa "Mixturação" do radialista e produtor musical Walter Silva "o pica-pau" , peças como "Daniel, Daniel , Meu Século" de Zeno Wilde Mendonça e "Pano de Boca", a primeira peça de Fauzi Arap. Ao lado, os bares Igrejinha,  Carbono 14 apresentavam choros e performances e tantos outros numa ebulição cultural que  durou até o final da década de 70 e então,  a cena passou a ser dominada pelo movimento punk, que vinha da periferia provocando o centro. O grande ponto dos punks era na estação metrô São Bento onde tiveram grandes apresentações de bandas clássicas do gênero    e  o madame Satã, uma espécie de Cabaret Voltaire de nossas vanguardas ansiosas para suas projeções artísticas e pessoais.
VILA MADALENA & PINHEIROS  FAZEM A TRANSIÇÃO
        Nesse cenário sempre efervescente, de uma reunião de amigos que se tornam sócios em um novo negócio para as artes, o subsolo de um pequeno galpão foi transformado em teatro na Rua Teodoro Sampaio em Pinheiros e levou o irônico nome de Lira Paulistana. Passou a ser o pólo da nova vanguarda que emergia para a próxima década ,confirmando definitivamente o que já afirmava a profética poesia do modernista Mário de Andrade, que vaticinava ser essa capital "A Paulicéia Desvairada " , a Babilônia dos novos tempos. 
Antropofagicamente, São Paulo resiste a tudo e vai se transformando permanentemente. Daí , a diversidade ser a característica dessa metrópole. Sua vocação cosmopolita.       
                                    No In-Edit Brasil  
FESTIVAL DE DOCUMENTÁRIOS MUSICAIS - 2012  em São Paulo :
LIRA PAULISTANA - A VANGUARDA PAULISTA - de RIBA DE CASTRO.

          "MEMÓRIAS PÓSTUMAS DA VANGUARDA PAULISTA"

Como Brás Cubas do famoso livro de Machado de Assis, personagem que depois de morto vai inventariando, revendo e reavendo sua vida, o filme de Riba Castro  vai relacionando uma sequência de depoimentos compondo sucessivamente o que passa a ser o enredo do filme. E conta , principalmente para os que não conheceram e viveram os acontecimentos narrados, a história do LIRA PAULISTANA  narrada pelos próprios personagens que protagonizaram essa história. Suas lembranças vão sendo entremeadas pela mão firme mas discreta da direção competente de Riba Castro. Surpreende e  algumas vezes esses depoimentos emocionam pela espontaneidade conseguida pelo diretor.Contrapõe imagens, algumas que já buscavam uma São Paulo antiga, que fica quase desfocada da memória com as imagens atuais dos narradores relacionando passado e presente, por suas lembranças e recordações ainda muito vivas. No caso, vanguarda como memória não deixa de ser proposição do que pode vir a ser. Sugere que a qualquer momento o LIRA e as idéias que o motivaram há 30 anos podem insurgir novamente, talvez em outras formas, outras pessoas, outros artistas. Mas elas ainda existem e estão vivas. No todo, não são monopólio de um espaço ou tempo. Embora nunca mais será igual como foi em seu surgimento. Mas nada na vida é. Tudo sempre muda.
RIBA CASTRO SURPREENDE NA DIREÇÃO DE SEU PRIMEIRO LONGA CONTANDO A HISTÓRIA DO LIRA PAULISTANA NO CINEMA.
Não à toa , o LIRA com o tempo foi saindo do buraco do porão para o mural na calçada dali para a eventos na praça Benedito Calixto ali à sua frente e depois chegou à avenida Paulista. Tornou-se móvel, visível, flexível e mais confortável. Sempre em expansão, produziu artes visuais, discos, livros, jornais.E em um de seus maiores eventos, um aniversário realizado na Praça Benedito Calixto, as apresentações são  coroadas pela apresentação de um dos principais nomes da contracultura brasileira, o do já então, consagrado Jorge Mautner, que em cena captada do show discursa contra as ditaduras, os autoritarismos e em  seguida  promove o jornal que estava sendo lançado ali.
A história do LIRA se insere nos movimentos de resistência, ele próprio decorrente das comunidades estudantis  e artísticas, que proliferaram na Vila Madalena quando a ditadura burguesa-militar ainda teimava em manter-se no poder mas já cambaleava atingida pelas greves operárias, denúncias de sua violência e torturas em seus porões. A campanha pela Anistia a forçava a abrir suas celas e fechar seus portões para dar espaço ao novo capitalismo, que se implantava no país dirigido por civis, políticos e seu discurso aspirava inventar um outro mundo possível e depois sustentável. Ou seja, o país no mundo em que vivemos hoje.
O filme de Riba Castro registra com objetividade os meandros desse labirinto.  Se antes  por interesses escusos do poder, a intenção era ocultar o que acontecia nos porões, no LIRA ao contrário, a intenção era revelá-los à todos os dispostos a descerem suas escadas até chegar no porão onde ficava o palco. 
Artistas, público, espaço,sócios-produtores sem diferenciações classificatórias vão falando à vontade , como se todos fossem da mesma casa, partilhando lembranças divididas com simplicidade e alegria por terem estado e por agora, também estar ali na tela do cinema. Antes da internet e todo desenvolvimento tecnológico disponível hoje , o LIRA já era um espaço de interatividade de produtores-artistas-público. Um espaço de invenção permanente em que ele próprio se reinventava.
        Os que participaram colaborando para sua existência e não sobreviveram também são homenageados "in memoriam" dentre eles, Plínio Chaves também um dos sócios e dos artistas , Itamar Assumpção,  o mais emblemático dos artistas independentes, que tocaram lá.        
                Talvez, o que precisasse melhor tratamento no filme são as músicas, que funcionam muito bem como trilha e estão bem editadas com as imagens. Mas alguns shows poderiam ter mais espaço na tela.Provoca a vontade de ver e ouvir mais.
 O blog do Lira está neste endereço :
http://lirapaulistana.net/            
          Com o filme de Riba de Castro, a "movimentação" que foi o LIRA como citado no filme, deixou ser apenas um endereço fixo de Pinheiros perdido na memória, para revivido pela arte do cinema  resistir e  reexistir em outros endereços provando, que a vida mesmo que seja breve, exige o cumprimento de seu destino tornando-se arte e assim se transformando sempre. 

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