A MENINA QUE ENTENDE DE GATOS , A POESIA DE ZENO WILDE MENDONÇA

                          

                                                  

Único livro de poesias publicado do poeta e dramaturgo  Zeno Wilde Mendonça, (Aquidauana, MS 1947 – São Paulo,   SP, 10 de Dezembro de 1998)                                                                         

                     DRAMATURGIA E TEATRO

               Depois de lançar este livro em 1973 Mendonça, entregou-se ao teatro e a dramaturgia. Abordou variados temas em suas peças, mas destacou-se por tratar da marginalidade em textos que fizeram sucessos no fim da década de setenta e início de 1980, quando emplacou Blue Jeans, montada e dirigida por Wolf Maya e grande elenco encabeçado por Maurício Mattar e Fábio Assumpção, então iniciantes. Mas Mendonça, só foi mesmo bem recepcionado pela crítica quando montou "Uma Lição Longe Demais" 

                                    

trazendo para o palco os problemas das escolas de periferia urbana. Com a excepcional atriz Gabriela Rabelo, interpretando a personagem principal e contracenando com apenas mais dois atores em cena. Essa peça lhe rendeu os prêmios  APCA, Mambembe e APETESP de Melhor Autor, em 1986. Foi comparado a Nélson Rodrigues e Plínio Marcos.  

ZENO WILDE MENDONÇA, POETA E DRAMATURGO MORTO EM 10 DE DEZEMBRO DE 1998, DEIXOU TEXTOS E POEMAS INÉDITOS.  

                                                      

            Além desses, estudante da EAD/ECA/USP integrou a geração que formou o "Pessoal do Victor. Assinou alguns textos com o codinome "Zeno Matogrosso." Logo, os "Secos & Molhados" surgiram e deixou de utilizá-lo para não ser confundido com o vocalista Ney, que fazia enorme sucesso nacional utilizando o Matogrosso depois do nome. Apresentou-me entre tantos livros, filmes, peças, autores como Campos de Carvalho, Tomas Mann (de quem tinha todos os livros), venerava o diretor italiano Luchino Visconti. A capa de seu único livro traz a foto de Veneza e do ator , que interpretou o personagem Tadzio, ícone de representação da beleza no filme "Morte em Veneza" em destaque.     

         

           Produziu textos como  Anjos da Guarda,  Sabe Quem Dançou?,  Olhos Cor de Mel de James Dean, Salve o Prazer - Assis Valente,  Uma Canção Desesperada,  Exagerei no Rímel ,  Zero de Conduta, Pasolini - A Segunda Morte de Pedro e Paulo , Verona - Ruptura e Sonho e um livro de micro contos, que permanece inédito até hoje. 

                     SEU EU NA POESIA 

            Sua poesia tem como característica ressaltar força da imagem projetando diretamente na imaginação do leitor, cenas de lutas medievais trazidas para o interior do homem atual, gerando ambiguidades e sugerindo, que o conflito interno que vive o poeta é o de uma batalha de seus desejos mais íntimos, sentimento obscuros que oscilam como um pendulo entre o bem e o mal; desconhecidos e que só através da viagem possibilitada pela poesia pode atingir essa verdade para então revelar-se em sua forma completa no poema.

           

             Em seu texto poético  utiliza-se de versos livres mas um tanto ritmados marcados por uma constante, que lembra o baixo-contínuo usado na música, especialmente em Bach, contrapondo-se a acontecimentos inusitados e inesperados, surpreendendo o leitor, chamando-o a co-participar do drama ou alegria que resulta do embate permanente que o poeta enfrenta consigo mesmo.

            

                  Canto I

    

     Experimentou 

     Tudo o que tinha de experimentar

     Aprendeu

     Todas as coisas a aprender

     Descobriu

     Todas as possíveis descobertas

     Escreveu

     Todos os poemas que deveria escrever

                Foi vida, foi espanto

                Foi morte, foi espera

       Sentiu-se completo

       Concluído em seu destino        

       Perfeito nas realizações

       Satisfeito em si,

       Olhou-se no espelho

       E descobriu

                

                 Que faltava-lhe 

                 A metade da cara.

                                           Março de 73

          Ás vezes lembra Pessoa, Alvaro de Campos,mas longe da natureza, a de Mendonça é humana e sempre sua. Resolve-se aprofundando-se mais e mais em suas crises.Até onde a busca é infinda. Finalizando ás vezes sendo duro, cruel e outras vezes com  certo humor negro e sarcasmo.

          Para Mendonça a língua poética deve estar sempre afiada. Pessoa é enigma, Drummond é solução. O primeiro  mistério oculto, o segundo o desvelo, a vida revelada. Os dois na mesma língua portuguesa moderna.

                                     

                   ARTE DE RESISTÊNCIA 

           Viveu nos piores anos da ditadura e fez de sua arte, a poesia e o teatro sua trincheira principal de resistência aos desmandos dos donos do poder e a loucura da sociedade. Político, sem ser homem de partido. Teve um primo que no início da década de setenta pretendia filiar-se as Forças Guerrilheiras do Araguaia, Paulo Mendonça, universitário não se sabe se chegou a concretizar esse ideal de luta. Tentou convencê-lo a acompanhá-lo nesta luta mas Zeno Wilde Mendonça, de origem mato grossense permaneceu em São Paulo, urbano, literário e libertário, não filiou-se à nenhum grupo estético. Preferiu a solidão e os riscos da independência artística.Lutou ao seu modo. Concentrando-se e colaborando com a guerrilha artística, subvertendo o comportamento dominante. Era mais de sua natureza.

          Deixou a paixão levá-lo onde a vida sempre o buscava. Amou como ninguém “A MENINA QUE ENTENDE DE GATOS" com quem depois teve uma filha adorada.No teatro, na luta, na vida, na labuta diária , 

sem escrúpulos ou temor fez  da busca retirada do antipoético, do esgoto social, do distante, da luta interna em sua forma cruel, do coração, fígado e intestinos do indivíduo, a poesia que  permeou toda sua arte,a que transforma, a que ficou.                                                                                                                

                                            Thaelman Carlos